Nesta página vou inserir, paulatinamente, alguns poemas do meu novo livro "Fragmentos de Poesia em campos de girassóis" - lançado no final de 2014.
Os meus fantasmas
Ah, os meus fantasmas!
Bom que caminhem sempre descalços
pelos pavimentos da memória.
Seria insuportável ouvi-los
partindo
rumo àquela festa sem volta.
Objetos esquecidos
De todas as minhas mortes
uma trouxe desalento
não foi morte anunciada
chegou às asas do vento.
Como quem tira o domingo
pra visitar distante ente
não trouxe qualquer bagagem
esqueceu vários pertences:
- uma inesperada lágrima
- um fugitivo silêncio
- e um relógio adormecido
sob a saudade e o tempo.
São tantas as minhas mortes
mas nunca morri por dentro.
Definição
Não definas poesia.
Agindo assim
trazes à tona e desnudas
o que é belo porque mistério.
Preserva-a
na tua mala de viagem
- inconclusa!
Dobradiças
1
Havia uma porta
aberta ao desconhecido
que instigava a curiosidade
do voo sem compromisso
sobre a silhueta do destino.
Éramos espaço
e o pecado nos vigiava
qual vento a roçar,
sutilmente, as cortinas.
2
Havia uma porta
que permanecia entreaberta
e o ranger das dobradiças
perturbava o silêncio
que descia lentamente
pelos fios da inexorável espera.
Sempre nos perguntamos
por que nunca se fechava?
Talvez, estrategicamente localizada,
nos permitisse visualizar
o horizonte fundir-se à estrada.
Fragmentos de poesia em
campos de girassóis
A indiferença do sisal
não pertence ao menino
- sua esperança afiada
não ousaria saquear girassóis.
Turvo – o rio
desenvolveu autossuficiência
- em sua subterrânea miséria
as lágrimas são fosforescentes.
No dia em que o bezerro agonizou,
atolado até ao pescoço,
construí o meu primeiro muro
- havia conchas suficientes
na tristeza de meu avô.
O domador de silêncios
ficou cego
- agora recria a melodia dos
bem-te-vis
com as recém-paridas mãos.
O meu pai tinha parentesco
com a terra,
sabia-lhe a fome, a sede, os desertos
- comungava a energia das raízes.
Autenticada na memória
a sua provação de fé
quando, desolado, chorou,
ao perder toda a colheita
e a minha mãe, impotente,
“passou um demorado café”.
A bailarina dissolve-se.
O catador recicla o dia.
Há liberdade
nos cárceres íntimos da palavra.
Celebra as tuas asas,
Poesia!